O amontoado de obras em cada esquina, em bairros como Mooca e Perdizes, é uma mostra do vigor recente do mercado imobiliário em São Paulo. Em março, pela primeira vez, o total de imóveis vendidos na capital paulista ultrapassou a marca das 100 mil unidades no acumulado de 12 meses, segundo pesquisa da Brain Inteligência Estratégica. Em relação ao período de 12 meses anterior, o crescimento foi de 25%.
A alta demanda tem promovido uma transformação na cidade. Até bairros tradicionalmente comerciais estão ganhando empreendimentos residenciais. É o caso, por exemplo, de Santo Amaro, que abriga o Largo 13 – região equivalente à 25 de Março na Zona Sul. A região aparece como quarto bairro com maior número de vendas e terceiro com mais lançamentos. E isso acaba se refletindo até na segurança do bairro, segundo o economista especialista em mercado imobiliário e CEO da Brain, Fábio Tadeu Araújo.
“Santo Amaro está modificando seu perfil de residencial para misto e isso é muito positivo. Quando os comércios fechavam, acabava o movimento do bairro, e agora você tem pessoas circulando em mais horários do dia”, diz o executiv
Outra região que se destaca nesse cenário é a Mooca, bairro tradicional da capital, que ainda mantém fábricas, galpões e casas que há alguns anos estão na mira do mercado imobiliário. Como no passado, em que o bairro abrigava famílias abastadas que construíam mansões (algumas delas ainda de pé), prédios de alto padrão também começam a ser levantados na região.
De acordo com o estudo da Brain, hoje a Mooca é a região líder em vendas na capital, com 3.540 apartamentos comercializados em 12 meses. O bairro da Zona Leste foi também o local que mais lançou novos apartamentos padrão no período e ficou em segundo lugar no lançamento de imóveis pelo Minha Casa, Minha Vida, atrás apenas do Jardim São Luís, na Zona Sul.
Para Araújo, o novo Plano Diretor da cidade tem papel fundamental no aumento da densidade demográfica do distrito. “A revisão do plano no ano passado estimulou a incorporação imobiliária próxima a metrôs, favorecendo parte do bairro. Outro ponto positivo da Mooca é a disponibilidade de terrenos, que possibilitou maior número de lançamentos”, diz ele.
Para o sócio proprietário da TREE – The Real Estate Environment, Daniel Diniz Sznelwar, fatores para além do transporte sobre trilhos intervêm na mudança de perfil da região. “A Mooca passa por uma transformação de um bairro industrial para residencial, muito por conta da recente Operação Urbana Bairros do Tamanduateí, que propõe uma série de ações para o desenvolvimento econômico, urbanístico e social da região, como a produção de moradia popular. Lá é uma região rica culturalmente, que tem de crescer, mas preservando sua história”.
Arnaldo Vieira, professor de planejamento urbano na Unip, argumenta que o mercado imobiliário só não vai ter uma interferência maior na Mooca porque o Departamento do Patrimônio Histórico (DPH) agiu rapidamente para tombar parte da região. Ele afirma ainda que a Mooca já tem uma infraestrutura que será aproveitada pelos novos moradores, mas que é necessário haver um investimento massivo em transporte público e mais segurança para as pessoas poderem usar transportes alternativos como as bicicletas, evitando problemas de trânsito com o adensamento na região.
Maria José Ferreira Alves será uma das novas moradoras da região: está prestes a se mudar para seu novo apartamento na Mooca, bairro que escolheu não apenas pelo preço acessível, mas também por sua necessidade de proximidade com o metrô, devido à sua deficiência visual. “Depois de 14 anos morando na Vila Mariana, escolhi me mudar para Mooca pela combinação de acessibilidade, conveniência e infraestrutura. Vou morar em um prédio mais moderno, com lojas no térreo, o que facilita muito a minha vida. O bairro, que une o antigo ao moderno, oferece ótimas padarias, cantinas, museus, escolas e até uma universidade próxima. Morar perto do metrô é uma necessidade para mim, não um luxo”, diz Maria José.
Na cidade toda, somente em março de 2024 foram lançados 21 empreendimentos residenciais, introduzindo 6.056 unidades no mercado. No mesmo período, as vendas líquidas totalizaram 8.154 unidades residenciais. Especialistas apontam que seria necessário menos de um ano para acabar com todo estoque existente na cidade se não houvesse nenhum lançamento no período.
Efeito dos juros
Para o economista Renan Pieri, professor da Fundação Getúlio Vargas, um fator importante para o crescimento do setor imobiliário nos últimos meses foi a queda dos juros. “A redução das taxas de juros pode impulsionar o mercado imobiliário, pois torna o crédito mais acessível e barato, diminuindo o custo das parcelas de empréstimos e facilitando a aquisição de imóveis dentro do orçamento familiar.”
Além disso, diz ele, com juros mais baixos, a poupança e outros investimentos financeiros se tornam menos atrativos, incentivando investimentos em imóveis, que podem oferecer melhores retornos por meio de aluguel ou valorização. Nesse sentido, a possibilidade de o ciclo de queda dos juros ter terminado na última reunião do Copom, ou estar muito perto de terminar, pode acabar sendo uma ducha de água fria no mercado.
O sócio da Vectis Gestão, Sergio Tormin, aponta que a redução do desemprego também é um fator relevante para o crescimento das vendas de apartamentos. A taxa de desemprego no Brasil diminuiu caiu de 14,9% no primeiro trimestre de 2021 para 7,5% no trimestre encerrado em abril de 2024, segundo dados do IBGE. “Com mais pessoas empregadas, há maior confiança e mais renda disponível para compra de propriedades”, diz.
Para Bruno Lessa, fundador do Grupo VGV e especialista em desenvolvimento imobiliário, o que não faltam são mecanismos para que alguém consiga comprar um imóvel hoje em dia. “Ao adquirir imóveis prontos, novos ou usados, o financiamento bancário é a opção mais comum, com uma variedade de produtos para diferentes perfis, incluindo taxas pré e pós-fixadas”, diz. “Para imóveis em construção ou na planta, o pagamento pode ser parcelado com a incorporadora até a conclusão, seguido de financiamento bancário.”
Ele lembra também que programas como o Minha Casa, Minha Vida oferecem facilidades para a compra do primeiro imóvel para famílias com renda de até R$ 8 mil, incluindo subsídios e juros menores. “Além disso, há alternativas como consórcios e negociações diretas, ampliando as opções disponíveis”.
Fonte: ABECIP– Por Estado de São Paulo– 03/06/2024