Com ciclo de alta de juros à vista, fundos imobiliários recalibram carteiras

O esperado ciclo de alta na taxa básica de juros (Selic) tem movimentado o setor de investimentos imobiliários. Com a perspectiva de custos maiores nos próximos meses, muitos FIIs (fundos de investimento imobiliário) têm aproveitado a janela para aumentar a alocação em empreendimentos mais resilientes.

No início de setembro, a Brookfield colocou sua fatia nos shoppings Pátio Paulista e Pátio Higienópolis, em São Paulo, à venda, depois de já ter se desfeito do shopping Rio Sul.

Um dos interessados nos ativos é a XP, que aproveitou o ciclo passado para abastecer o caixa.

“Os últimos 12 meses foram muito positivos para nós. Mesmo com juros altos, levantamos aproximadamente R$ 6,5 bilhões, com uma expectativa bem clara de queda de juros [no mercado]. Estávamos preparados e pegamos carona nesse movimento”, afirma Pedro Carraz, sócio da XP e gestor da XP Asset.

Até abril, o mercado financeiro trabalhava com a previsão de queda da Selic para um dígito. Expectativa que, não só não se concretizou, como se inverteu. Segundo o boletim Focus, a Selic deve ir dos atuais 10,50% para 11,25% ao fim do ano.

Para Carraz, a alta de juros não inviabiliza o cenário de negócios.

“Não à toa a Brookfield colocou agora os dois Pátios à venda. Já vivemos um mundo de juros bastante altos e nem por isso os negócios imobiliários deixaram de ser feitos. É claro que talvez eles fiquem um pouquinho menos recorrentes, mas sempre há oportunidades porque o investimento no mercado imobiliário é necessariamente de longo prazo. Pode ser que seja um pouquinho pior nos próximos 12 meses, com juros mais altos, mas é um investimento para daqui cinco, dez, 15 anos”, diz o gestor.

Segundo Carraz, a gestora não olharia qualquer operação de shopping hoje em dia, mas uma transação com ativos de maior qualidade, como os Pátio Paulista e Higienópolis “é algo que pode fazer sentido”. “São imóveis irreplicáveis e que terão espaço e mercado independente do patamar de juros.”

A lógica se repete em lajes corporativas. Em São Paulo, escritórios no eixo da Avenida Faria Lima seguem ocupados, com bons retornos de aluguéis, ao contrário de regiões como a Avenida Doutor Chucri Zaidan, na Barra Funda e em Alphaville, que observam um crescimento nas taxas de vacância.

Com o foco na resiliência da alta renda, um dos ativos que irá receber parte dos fundos captados pela XP é o “Projeto Jardins”, que visa construir um complexo de escritórios e torre residencial na Oscar Freire, inspirado no Rockefeller Center, de Nova York.

Não foi só a XP que captou no mercado. Entre janeiro e agosto deste ano, as operações de fundos imobiliários levantaram R$ 34,7 bilhões, 143% a mais que no mesmo período do ano anterior. Agosto, porém, foi o mês de menor captação, com R$ 2,6 bilhões.

“Fizemos a emissão de um fundo de logística há poucos meses, e já foi bem difícil. O juro que a gente tem hoje já inviabiliza ou dificulta bastante as emissões de fundos novos e menores”, diz André Sawaya, CEO da Panorama AZ Quest e responsável pela estratégia de fundos imobiliários da AZ Quest.

Dos R$ 400 milhões planejados, a gestora arrecadou R$ 161 milhões. Uma parte dos valores está guardada justamente para aproveitar as oportunidades deste ciclo de alta de juros, com mais vendedores que compradores.

“Normalmente, a maior parte dos investidores fica sem conseguir acessar mercado quando é o melhor momento para comprar justamente porque a taxa de juros está alta e há pouca liquidez. Agora, estamos com uma dinâmica favorável porque ninguém está levantando dinheiro novo no mercado. Então, nós conseguimos olhar com calma e identificar uma boa oportunidade”, diz Sawaya.

Além de galpões logísticos, a gestora foca prédios residenciais de médio e, em maioria, alto padrão em São Paulo, financiando incorporadoras como You,inc, Helbor e Lote 5.

“O alto padrão depende menos de crédito de financiamento bancário. Essa alta de juros não tende a ter um impacto tão relevante nos lançamentos. Vemos alguns incorporadores diminuindo o ritmo, mas não são todos”, afirma o gestor.

Segundo Sawaya, o efeito deste ciclo de aperto monetário também é mais limitado por não suceder um ciclo de queda de juros que gerou uma euforia no setor imobiliário.

“Não acho que o momento seja comparável aos outros ciclos de alta de juros. Agora, a taxa já está elevada e pode chegar a, no máximo 12%, segundo previsões do mercado. Então, impactos devem ser mais comedidos”, diz Caio Nabuco, analista da Empiricus Research.

Entre 2015 e 2016, durante a pior recessão econômica do Brasil, a Selic chegou a 14,25% ao ano.

De acordo com Danilo Barbosa, sócio e diretor de análise do Clube FII, dado a natureza de longo prazo do setor imobiliário, ele é mais sensível aos juros futuros do que à taxa Selic, e como essas taxas não tiveram uma oscilação brusca nos últimos meses, e seguem abaixo de 12% ao ano, as perspectivas para FIIs também não passaria por grandes mudanças.

“O mercado está aquecido, independente da Selic dessa canetada do Banco Central que ocorre a cada 45 dias”, diz Barbosa.

QUANDO INVESTIR EM FII?

Segundo Leonardo Alves, analista de investimentos da Medici Asset, os FIIs podem ser uma opção atrativa para investidores com perfis moderado e arrojado, que buscam diversificação e renda passiva através de dividendos mensais. Por outro lado, esse tipo de investimento pode não ser o mais indicado para investidores conservadores, devido à volatilidade e aos riscos associados.

“Em prazos mais longos, eles podem oferecer retornos superiores ao Tesouro IPCA+. Outra vantagem é que eles proporcionam diversificação com equipes especializadas em investimentos imobiliários e muitos possuem alta liquidez, facilitando a venda dos ativos”, diz Alves.

 

Fonte: Folha de São Paulo – Por Júlia Moura – São Paulo, 15/09/2024

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