Saneamento é prioridade de Estado

Nenhum país do mundo alcançou desenvolvimento sustentável sem investir em infraestrutura básica. Água tratada, esgoto coletado, energia confiável e logística eficiente são pré-requisitos para saúde pública, educação, produtividade e justiça social. O déficit em saneamento talvez seja, no Brasil, o maior símbolo das desigualdades estruturais – e, ao mesmo tempo, uma enorme oportunidade de transformação.

Se há um denominador comum entre países que conseguiram superar desigualdades históricas e se tornar economias resilientes, ele está no investimento contínuo e estratégico em infraestrutura essencial. Estradas, mobilidade urbana, energia e, sobretudo, saneamento são os alicerces invisíveis que sustentam o bem-estar coletivo e a competitividade produtiva. Como afirma o professor Michael Porter, da Harvard Business School, “nenhuma nação compete bem globalmente se falha em prover infraestrutura eficiente para sua população”.

O Brasil vive um paradoxo: é uma das dez maiores economias do mundo, mas convive com 36 milhões de pessoas sem acesso à água tratada e 96 milhões sem coleta de esgoto. O custo desse atraso é visível na saúde pública, nas faltas escolares, na baixa produtividade e nas perdas ambientais.

Países que um dia enfrentaram realidades semelhantes apontam o caminho da virada. O Chile, por exemplo, universalizou o acesso à água potável e tratamento de esgoto em menos de 20 anos, por meio de regulação eficiente, contratos bem modelados e ambiente estável para parcerias público-privadas. Já a Coreia do Sul, até os anos 1970 marcada por deficiências urbanas graves, transformou sua base de infraestrutura com planejamento de longo prazo e integração entre investimento público e capital privado.

No Brasil, uma experiência relevante vem sendo construída pela Águas do Rio, empresa da Aegea Saneamento, responsável por operar serviços de água e esgoto em 27 municípios fluminenses. A operação foi estruturada com a participação de fundos nacionais e internacionais, como o GIC (fundo soberano de Singapura), Itaúsa e EPCA, além da emissão de debêntures sustentáveis (SLBs) que atrelaram o financiamento a metas ambientais e sociais. O modelo mostra como o capital privado pode ser mobilizado com responsabilidade para impulsionar infraestrutura com impacto.

A economista Mariana Mazzucato, da University College London, argumenta que Estados não devem apenas corrigir falhas de mercado, mas liderar missões de transformação. Isso exige uma regulação que incentive eficiência, proteja o interesse público e estimule a inovação, pilares ainda em construção no Brasil, mas cada vez mais urgentes.

O saneamento, em especial, é um setor com grande efeito multiplicador. Segundo o Instituto Trata Brasil, cada R$ 1 investido gera R$ 4 em benefícios sociais, entre economia na saúde, valorização imobiliária e aumento da renda local. É infraestrutura com retorno garantido, inclusive financeiro.

A agenda de infraestrutura brasileira precisa ir além de obras pontuais. É necessário fortalecer a institucionalidade, promover estabilidade regulatória e criar condições para que empresas sérias atuem com escala, eficiência e impacto social. A boa infraestrutura não é um luxo, é um direito. E também é, como mostraram Chile e Coreia, uma estratégia nacional de desenvolvimento.

O Brasil só será verdadeiramente competitivo e justo quando fizer da infraestrutura sua prioridade de Estado – e não apenas de governo.

Fonte: Valor Econômico – Por Wellington Vitorino – 11/06/2025

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