A expectativa de crescimento da economia e aumento dos investimentos no setor imobiliário devem impulsionar as emissões de Certificados de Recebíveis Imobiliários (CRI) no próximo ano.

Depois de queda de 21% no volume de emissão desses ativos em 2018, que soma R$ 5,147 bilhões até outubro, o mercado vê potencial desse montante dobrar no ano que vem com a retomada dos investimentos no segmento imobiliário. A Câmara Brasileira da Indústria da Construção (CBIC) projeta que lançamentos e vendas de imóveis no país devem crescer cerca de 10% a 15% na comparação com 2018.

 

 

Com o crédito dos bancos ainda escasso para as incorporadoras e a taxa básica de juros no menor patamar histórico, aos 6,5% anuais, as empresas do ramo imobiliário têm usado as emissões de CRIs para captar recursos destinados a novos investimentos e também ao financiamento direto a clientes. Gafisa, Cyrella e Helbor foram algumas das companhias que captaram neste ano por meio de CRI.

A Direcional Engenharia está com uma oferta de R$ 215 milhões em andamento, que será realizada pela Ápice Securitizadora. Os papéis, que terão como lastro recebíveis emitidos pela Direcional, terão vencimento em 2024 e pagarão retorno de 4% ao ano mais a variação do IPCA. Os recursos captados serão destinados ao financiamento de novos empreendimentos. "Estamos bastante otimistas de que o mercado de CRI vai ter mais espaço no ano que vem", afirma Flávia Palacios, sócia da RB Capital. A gestora estima levantar entre R$ 3 bilhões e R$ 4 bilhões em ofertas de CRI neste ano. "Devemos dobrar esse volume no ano que vem e alcançar pelo menos R$ 6 bilhões em emissões", diz Flávia.

A queda no volume de ofertas de CRIs neste ano, segundo Flávia, é explicada pelo recuo das emissões corporativas, realizadas por empresas que usam o estoque imobiliário para captar recursos. "Essas emissões recuaram neste ano com o ambiente pouco estável com a greve dos caminhoneiros e a realização de eleições."

Com os juros em patamares baixos, a emissão de CRIs com lastro em recebíveis de imóveis residenciais também deve crescer. Esses papéis, chamados de "pulverizados", têm como lastro contratos de vendas de imóveis de uma incorporadora, por exemplo, para diversos clientes, representados por Cédulas de Crédito Imobiliário (CCIs), além de contar com os empreendimentos como garantia.

Com a redução do crédito imobiliário nos últimos anos, algumas incorporadoras passaram a fazer o financiamento direto de seus clientes para depois vender esses recebíveis no mercado por meio de CRI. A Gaia Secutirizadora fez uma emissão de R$ 128,145 milhões de CRIs pulverizados em junho, que tinham como lastro recebíveis de contratos de venda de imóveis residenciais da Cyrela Brazil Realty. Os recursos captados serão usados para o desenvolvimento de novos empreendimentos. O diretor de relações com investidores da Gaia Securitizadora, Lucas Drummond, vê potencial de captação de recursos via CRI principalmente para projetos de médio padrão, acima do programa Minha Casa Minha Vida.

"O financiamento do crédito imobiliário com recursos da poupança é limitado e a taxa de juros baixa torna o CRI competitivo", diz Flávia, da RB Capital. A gestora está montando um fundo para comprar recebíveis performados, ou seja, de imóveis prontos de diversas incorporadoras até montar uma carteira que tenha tamanho suficiente para ser vendida no mercado via a emissão de CRI.

A Habitasec também está preparando um fundo imobiliário, que deve ser inicialmente de R$ 60 milhões, para comprar recebíveis de loteadoras e incorporadoras. O sócio da Habitasec, Vicente Nogueira, afirma que incorporadoras de médio porte têm buscado o mercado de capitais para financiar projetos imobiliários. A securitizadora deve fechar o ano com R$ 1,2 bilhão de CRIs emitidos.

Os CRIs representavam 6% do funding para financiamento imobiliário em outubro, segundo dados da Associação Brasileira das Entidades de Crédito Imobiliário e Poupança (Abecip). A participação desse papel, no entanto, tem espaço para crescer à medida que outras fontes de recursos, como o FGTS e a poupança, serão insuficientes para atender o aumento da demanda no mercado imobiliário.

O sócio da XP Investimentos e chefe da área de distribuição institucional de renda fixa, Getúlio Lobo, lembra que a aprovação na Câmara de mudança no distrato, que estabelece que o comprador de um imóvel na planta terá que pagar 50% do valor já dado à construtora como multa para desfazer o negócio, deve ajudar a dar mais segurança para os investidores. "Temos um ambiente mais saudável para as incorporadoras com a nova lei do distrato", diz Lobo, que tem mandato de R$ 1,6 bilhão em ofertas a ser distribuído no mercado.

Pelo fato de os CRIs contarem com isenção fiscal para os investidores pessoas físicas, as captações de recursos no mercado de capitais chega a ser mais barata que os empréstimos bancários para construção, afirma Carlos Ferrari, sócio do escritório N, F&A. Empresas de outros setores que têm um patrimônio imobiliário grande também têm usado esse instrumento como alternativa de captação de recursos mais barata. A Rede D'Or, por exemplo, acaba de levantar R$ 600 milhões em uma emissão de CRI. O Hospital Albert Einstein também fez uma emissão, de R$ 400 milhões neste ano. "Isso faz sentido para o setor hospitalar, que tem uma base imobiliária muito grande", afirma Flávia.

Empresas de varejo também têm usado o patrimônio imobiliário para levantar recursos para financiar a expansão dos negócios. A Droga Raia, por exemplo, estuda usar os imóveis da rede de farmácias como lastro para captar recursos via CRI.

Já a Gaia trabalha em algumas emissões de CRI para empresas de shopping centers de médio porte, que têm como lastro os recebíveis em aluguéis desses empreendimentos. "São captações voltadas para a aquisição de empreendimentos já existentes", diz Drummond. Ele lembra que emissões de CRIs com lastro em recebíveis de aluguel de galpões "built to suit" - construídos sob encomenda para um cliente - também estão aquecidas.

Do ponto de vista da demanda, Lobo, da XP, afirma que o aumento dos fundos imobiliários que compram recebíveis deve impulsionar a demanda por CRIs. O patrimônio dessas carteiras passou de R$ 10,1 bilhões em novembro de 2017 para R$ 11,6 bilhões em outubro passado, segundo dados da Associação Brasileira das Entidades dos Mercados Financeiro e de Capitais (Anbima).

A executiva da RB Capital lembra que os eventos de inadimplência nesses instrumentos, como no caso dos papéis da PDG e da Viver, são vistos como pontuais e não reduziram a demanda pelo papel. "Temos visto a base do investidor crescer, tanto de varejo quanto do institucional", diz Flávia.


Fonte: Valor, Por Sílvia Rosa de São Paulo, 11/12/2018