A economia brasileira está em recuperação. Gradual e lenta. Mas desde o final do ano passado, quando atingimos o fundo do poço, a produção agrícola recorde deu um impulso ao crescimento do PIB, no primeiro semestre, e o consumo, impulsionado pela liberação do FGTS, pela queda na taxa de inflação e na taxa de juros está trazendo uma gradual melhoria no emprego, dando assim sinais mais consistentes de recuperação.

Como há capacidade ociosa, a recuperação da economia terá continuidade e sem dúvida o ano de 2018 deverá ser bem melhor que este ano. Um crescimento do PIB, quase consensual de 2,5%, deixa de ser otimista. Entretanto, a taxa de investimento ainda não tem dado sinais de reativação.

Assim, a grande questão é quando os investimentos serão realmente ativados, de forma significativa, tornando irreversível a recuperação em andamento? Em outras palavras, quando os empresários recuperarão realmente a confiança no futuro? Aqui mora a incerteza.

De um lado, a crise política é estrutural e se arrastará não dando ainda sinais de entendimento mínimo entre as partes. Para as eleições residenciais de 2018 nenhum candidato tem projetos racionais e ao mesmo tempo consegue empolgar as massas. O comportamento do eleitorado é ainda mais incerto.

Neste quadro político imprevisível, devemos lembrar que num passado recente assistimos a um processo de impeachment da presidente; a Lava-Jato continua denunciando dezenas de políticos por corrupção, inclusive duas denúncias contra o próprio presidente da Republica, em exercício, mas não aceitas pelo Parlamento. Neste quadro político dramático o melhor que podemos fazer é uma convenção, uma hipótese de trabalho, de que a economia está relativamente blindada da política. Em outras palavras, uma convenção otimista de que pior do que está não deverá ficar e que as decisões econômicas dependerão das expectativas puramente econômicas. De outra forma, o economista nada teria a declarar.

O que o futuro nos coloca? Em primeiro lugar, está absolutamente claro que sem um conjunto de reformas estruturais e profundas o crescimento  potencial da economia brasileira não deverá se distanciar de um medíocre crescimento médio entre 2% e 2,5%. Este seria um cenário básico otimista e de referência, a taxa de crescimento efetiva ficará em torno do potencial e teríamos uma estabilidade ainda que instável.

Esta hipótese se torna plausível desde que o ajuste fiscal avance, uma parte pelo menos da reforma da Previdência proposta pelo atual governo seja aprovada e o próximo presidente eleito em 2018 seja capaz de levar a cabo o projeto. O teto constitucional de gasto público seja efetivamente implementado, com definição de medidas operacionais, e que a relação dívida pública-PIB se estabilize em três anos. Esta hipótese requer que o mercado acredite no ajuste fiscal e tenha paciência até lá. Ao final de três anos, a política fiscal terá que tornar-se anticíclica de tal forma que o déficit público seja zerado, quando a economia estiver crescendo à taxa potencial. A taxa real média de juros deverá ser menor ou igual ao crescimento do PIB potencial.

Num cenário alternativo, a reforma da Previdência avança muito pouco e a operacionalização do teto de gastos enfrenta muitas dificuldades políticas. Diante do crescente déficit primário e crescimento explosivo da dívida pública, o governo toma medidas no sentido de elevar a carga tributária.

Diante do descumprimento da norma constitucional do teto de gasto público o clima no mercado se deteriora e como as despesas continuam com sua dinâmica de expansão atreladas a indexações e vinculações ao PIB, por lei, o aumento da tributação tem efeito temporário e em poucos anos os déficits primários voltam a crescer e com isso a dívida pública retoma seu ritmo de crescimento explosivo. Isto nos leva a situação parecida com a que vivemos no primeiro semestre de 2014 e inicia-se uma nova crise de confiança.

As expectativas se deterioram, a inflação volta a se acelerar e o Banco Central é obrigado a elevar rapidamente as taxas de juros. A economia brasileira caminha para uma situação de dominância fiscal: quanto mais o Banco Central aperta a politica monetária, com elevação da taxa de juros, mais rapidamente aumenta o desequilíbrio fiscal, com aumento da despesa de juros, e a dívida pública em relação ao PIB. A inflação passa a ser um problema fiscal. Na medida que a mobilização política impede o corte na dinâmica de expansão dos gastos o desequilíbrio orçamentário intertemporal do governo se torna evidente e passa a alimentar expectativas futuras sombrias.

Se chegarmos a esta situação explosiva não restará ao governo opção senão executar um drástico ajuste e reforma fiscal, reestabelecendo com novas instituições e nova lei fiscal a credibilidade do governo. Quanto mais profundas forem as reformas mais rapidamente a confiança poderá retornar.

Sabemos que ajustes bem-sucedidos ocorrem rapidamente e com cortes profundos na despesa corrente e não com aumento de impostos. Na nova lei fiscal além de melhor coordenação e controle das políticas monetária, fiscal e cambial, que deverão estar voltadas para o crescimento, uma reforma do aparelho de Estado e maior participação da sociedade civil no controle de gastos será um requisito fundamental para restabelecer a confiança.

Yoshiaki Nakano, com mestrado e doutorado na Cornell University, é professor e diretor da Escola de Economia da Fundação Getulio Vargas (FGV/EESP) e escreve mensalmente neste espaço.


Fonte: Valor - Opinião, por Yoshiaki Nakano, 14/11/2017