Depois de proibir a farra do boi em Santa Catarina e a briga de galo no Rio de Janeiro, os ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) decidiram impedir outra prática que consideraram de maus tratos a animais: a vaquejada. Por um voto de diferença, julgaram  inconstitucional a Lei nº 15.299, de 2013, do Ceará, que regulamenta a atividade.

Na prática, a decisão declara que a atividade implica maus tratos aos animais e, portanto, está sujeita a penalidades legais, segundo o ministro Marco Aurélio Mello, cujo voto prevaleceu no julgamento. "Muito embora seja uma lei do Ceará, sinalizamos para outros Estados que a vaquejada implica maus tratos aos animais", afirmou o relator no fim da sessão. Na vaquejada, uma dupla de vaqueiros, montados em cavalos distintos, busca derrubar um touro, puxando­o pelo rabo dentro de uma área demarcada.

A decisão foi dada em ação direta de inconstitucionalidade (Adin) apresentada pela Procuradoria­Geral da República (PGR). O órgão pedia a  suspensão da eficácia da Lei nº 15.299, de 2013, que estabelece as regras paraa realização da vaquejada como atividade desportiva e cultural. A norma fixa os critérios para a competição ­ que poderia ser amadora ou profissional ­ e obriga os organizadores a adotarem medidas de segurança para os vaqueiros, público e animais.

O julgamento estava suspenso desde junho. O assunto dividiu os ministros. A solução foi dada no último voto, da presidente da Corte, ministra Cármen Lúcia. Ela considerou que a atividade traz sofrimento aos animais, mesmo que a lei tente preservá­los. "Parece­me que tem razão a PGR ao pedir a declaração de inconstitucionalidade de dispositivos da lei", afirmou a presidente. A ministra acrescentou que sempre haverá quem defenda que a atividade é antiga e faz parte da cultura popular. Mas ponderou que "cultura se muda". 

A ministra acompanhou o voto do relator, ministro Marco Aurélio Mello. Para ele, a "crueldade intrínseca à vaquejada" não permite a prevalência do valor cultural. O relator explicou que, antes de ser derrubado, o boi é enclausurado, açoitado e instigado a sair em disparada. Laudos técnicos indicam fraturas nas patas e rabo e o comprometimento da medula óssea. Os ministros Dias Toffoli e Ricardo Lewandowski também votaram na sessão de ontem. Lewandowski acompanhou o relator. Já o ministro Dias Toffoli seguiu a divergência. Em seu voto, afirmou que a atividade existia há muito tempo, mas somente quando surgiu a Lei nº 15.299, em 2013, que a prática foi questionada.

Toffoli destacou que a lei traz, justamente, a preocupação em organizar a atividade, além de dispositivos para evitar maus tratos aos animais. Não há prova de que os animais sejam vítimas de abusos ou crueldades, segundo o ministro. No entanto, Toffoli ficou vencido, junto com os ministros Luiz Fux, Edson Fachin, Gilmar Mendes e Teori Zavascki, que também defendiam a validade da lei estadual. Além da presidente da Corte e do relator, os ministros Luís Roberto Barroso, Rosa Weber e Celso de Mello votaram contra a lei.

Ao fim do julgamento, o advogado Antônio Carlos de Almeida Castro, que representou a Associação Brasileira de Vaquejada na ação, afirmou que não era possível saber exatamente qual o efeito prático e a dimensão da decisão, já que a lei buscava colocar parâmetros para a atividade. "A decisão não pode proibir a vaquejada no Brasil", disse.


Fonte: Valor - Legislação, por Beatriz Olivon, 07/10/2016