A contratação da Sabesp para operação de saneamento em Guarulhos (SP), cujo protocolo de intenções foi assinado na sexta-feira entre a cidade e o governo de São Paulo, deve trazer benefícios de curto prazo para a segunda maior cidade do Estado, além da solução definitiva para um débito bilionário com a empresa.

As negociações entre a companhia e a cidade começaram há alguns anos devido à dívida pelo não pagamento de fornecimento de água no atacado, que já atinge R$ 3,2 bilhões. "Já havia um primeiro entendimento de um acordo por conta da dívida, mas que acabou ampliando para essa contratação. Fizemos uma avaliação de como está o sistema de abastecimento de água em Guarulhos e identificamos um problema muito sério de rodízio, as pessoas só tem água em torno de oito horas por dia", disse Karla Bertocco, presidente da Sabesp, ao Valor. Nesse modelo, o débito municipal será abatido no decorrer da operação.

Do ponto de vista municipal, o desembolso necessário para reforçar esse abastecimento seria mais complicado, devido às restrições fiscais do municípios e o peso da dívida com a Sabesp, que já haviam se convertido em precatórios. Para a empresa, o processo é ainda menos custoso, pois envolve a integração da cidade, hoje isolada, com o sistema regional.

Atualmente, pelo regime de contratação em atacado, a cidade é abastecida apenas por uma entrada, e desse ponto a água é distribuída até os bairros mais distantes. "Quando a Sabesp passa a operar este município a gente acaba inserindo ele no conceito de sistema integrado, acabo tendo outras portas para abastecer. Então é mais racional e sai barato para acabar com o rodízio com a Sabesp", explica a presidente.

A companhia já tem desenhado todo o plano de obras para a cidade, após a assinatura do contrato, o que, caso todos os ritos legais sejam cumpridos, deve sair em até 90 dias. A projeção é de que, nos primeiros seis meses, alguns bairros já devam deixar de ter abastecimento intermitente. A ideia é que, no fim de 2019, o bairro mais distante da fronteira de São Paulo esteja com isso solucionado.

"O que vínhamos discutindo com o prefeito é de que isso poderia ser uma situação de ganha-ganha, à medida que se equaciona a questão da dívida, recupera a capacidade de financiamento do município, e fazemos os investimentos para rapidamente utilizar essas facilidades de já estar em outras regiões", aponta Karla. Os investimentos estimados pela companhia são de R$ 1,7 bilhão.

Do ponto de vista de esgoto, a operação e as obras na cidade deverão ser compartilhadas com a Aegea, que atualmente é a responsável por uma Parceria Público-Privada (PPP) para a cidade, comprada da OAS no início do ano. O escopo das obras dessa PPP deve ser revisto, uma vez que parte das estruturas seriam praticamente duplicadas pela questão de a Sabesp não operar em Guarulhos. Uma decisão judicial inclusive já havia apontado a necessidade de adequação ao planejamento regional.

Na prática, as obras da Aegea irão destinar apenas parte do esgoto da cidade para as estações de tratamento de esgoto (ETE) locais. A outra parte dos rejeitos será enviada à duas estações limítrofes, instaladas em São Paulo. A questão do esgoto guarulhense é parte central da resolução do problema de poluição no rio Tietê, uma vez que ainda é significativo o despejo in natura nas águas.

Segundo os cálculos da Sabesp, a partir da análise da qualidade da água em certo ponto do curso do rio na cidade São Paulo, a estimativa é de que o nível de oxigênio na água cresça sete vezes após a conclusão das obras de esgoto.

Toda essa mudança ainda está condicionada à aprovação de projeto de lei na Câmara Municipal de Guarulhos. O prefeito de Guarulhos, Gustavo Henric Costa, conhecido como Guti, do PSB, mesmo partido do governador paulista, Márcio França, deve encontrar resistência da oposição, liderada pelo PT, maior bancada da cidade. "A expectativa é de que haja discussão racional, os benefícios estão apresentados", defende Karla.

Além disso, será preciso dar uma solução para os funcionários do SAAE, empresa pública municipal responsável atualmente pela operação de saneamento da cidade. As possibilidades são a abertura de um programa de demissão voluntária, realocamento de parte dos empregados para a prefeitura e cessão temporária de um grupo para a Sabesp, de até quatro anos, em modelo semelhante ao feito anteriormente em São Bernardo do Campo e Diadema.

Para a Sabesp, ainda não há o cálculo do impacto financeiro exato da incorporação de Garulhos à operação. Em população, o crescimento seria de aproximadamente 5% do atendido hoje. Em relatório, apesar da ausência de detalhes do contrato, o Credit Suisse apontou aumento de receita de R$ 300 milhões por ano, caso o protocolo de intenções de fato torne-se contrato. O mercado recebeu bem o acordo: ações da Sabesp fecharam em alta de 3,41%. 
(Colaborou Marcelle Gutierrez)

Fonte: Valor - Empresas, por Rodrigo Rocha , 24/09/2018