Em meio à volatilidade do mercado, os fundos de debêntures incentivadas, que investem em títulos de projetos de infraestrutura, têm apresentado uma boa performance e despertado o interesse dos investidores. O patrimônio dessas carteiras, que ainda engatinham no país, atingiu R$ 4,3 bilhões em junho, alta de 19% em relação ao mesmo período do ano passado.

Esse volume pode quadruplicar, segundo estimativa da Associação Brasileira das Entidades dos Mercados Financeiro e de Capitais (Anbima), com a participação do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES). O banco anunciou investimentos de R$ 5 bilhões em fundos que compram papéis do setor, limitando-se a 30% do patrimônio. Além de entrar como cotista em portfólios de terceiros, o BNDES vai criar um fundo com as debêntures de infraestrutura que tem em carteira.

O aumento da demanda por esse tipo de produto é reflexo do crescimento das ofertas de debêntures incentivadas, que já bateram recorde neste ano com R$ 13,173 bilhões até julho. O estoque desses títulos no mercado, em julho, era de R$ 49,4 bilhões. O potencial desse mercado é grande. A Kinea estima que o investimento necessário em infraestrutura até 2020 no Brasil é de R$ 380 bilhões. Só os projetos que já foram a leilão vão exigir R$ 140 bilhões.

A maior demanda de investidores por crédito privado diante da queda da taxa Selic para 6,5% também contribui para o avanço dos fundos de debêntures incentivadas. Essas carteiras têm mostrado um bom desempenho apesar da volatilidade dos ativos financeiros. No ano, até julho, o retorno médio desses fundos foi de 5,96%, segundo levantamento do Valor Data, superior à variação do CDI (3,73%) e do IMA-B (3,50%), índice que mede o comportamento de uma carteira de Notas do Tesouro Nacional - série B (NTN-Bs), muito usado como benchmark desses portfólios. Os fundos de debêntures incentivadas contam com uma vantagem a mais, pois os investimentos são isentos de Imposto de Renda.

As debêntures de infraestrutura pagam um retorno atrelado à variação do IPCA mais spread pelo risco de crédito, que tende a superar a rentabilidade das NTN-Bs. "É um investimento que se encaixa na estratégia de diversificação em renda fixa", diz Sandra Blanco, consultora de investimentos da Órama. Além de ser uma proteção contra a inflação, essas carteiras podem se beneficiar de uma queda dos juros se o cenário macroeconômico ficar mais positivo.

A grande vantagem de investir via fundos é a diversificação maior do risco do que na compra direta das debêntures de infraestrutura. Nos fundos da Órama, por exemplo, o limite de exposição por companhias abertas é de 10%. "O investidor que compra apenas um papel acaba concentrando o risco. No fundo, ele vai ter um retorno menor, mas não a perda total do investimento", diz Sandra.

A aplicação nesses fundos pode ser uma boa oportunidade também para investidores de varejo, que têm dificuldade de acessar as ofertas das debêntures incentivadas, colocadas, na maior parte, por meio de distribuição restrita (pela Instrução 476, voltada para investidores com mais de R$ 10 milhões em investimentos). Na Órama, a aplicação inicial via fundo é de R$ 1 mil. Já na gestora do Brasil Plural, a aplicação mínima é de R$ 100.

Além disso, como se tratam de investimentos em papéis emitidos por projetos, nem sempre o investidor pessoa física consegue fazer a avaliação apropriada do risco. Algumas debêntures de infraestrutura, como as de Santo Antônio Energia, Termelétrica Pernambuco III e Concessionária Rodovias do Tietê, já tiveram que ser renegociadas. "As gestoras possuem uma equipe de análise de crédito para avaliar os projetos", diz Sandra, da Órama.

Outra vantagem de investir no setor de infraestrutura via fundos é a gestão ativa das carteiras, que busca capturar os momentos mais favoráveis no mercado para a compra e venda dos papéis, segundo Fausto Silva, sócio e gestor de renda fixa da XP Gestão de Recursos. A XP, por exemplo, aproveitou o aumento das taxas das debêntures de infraestrutura no mercado secundário para comprar alguns papéis com bom rating que estavam com preços descontados, como as debêntures da Vale e da AutoBan, da CCR.

"Aproveitamos o momento de incerteza para fazer boas alocações", diz Silva. A gestora tem um fundo com prazo de resgate de 30 dias e pretende lançar ainda este ano outra carteira com carência de 60 dias para saques.

Já a Kinea levantou R$ 650 milhões neste ano com a oferta do fundo de recebíveis Kinea Infra, que paga rendimentos semestrais. A estratégia da gestora tem sido buscar projetos já operacionais em que possa ter uma participação relevante da oferta e, com isso, ter mais poder de atuação em caso de renegociação. No último investimento realizado, a gestora comprou 68% da emissão de R$ 126,4 milhões de debêntures da Transmissora José Maria de Macedo. Ao todo, a carteira já investiu em sete papéis e acumulava retorno de 7,7% no ano até julho.

Apesar de esses fundos investirem em papéis de longo prazo, de até 18 anos em alguns casos, a carência para resgate dessas carteiras no mercado chega a 45 dias. O prazo curto, segundo os gestores, foi possível pela melhora da liquidez das debêntures de infraestrutura no mercado secundário, com algumas empresas inclusive contratando formador de mercado para dar referência de preço para algumas emissões.

No caso do fundo da Kinea, as cotas são listadas em bolsa e contam com formador de mercado. Outro portfólio de infraestrutura que tem a cota listada na bolsa é o FIDC BB Votorantim Highland Infraestrutura. Essas carteiras, contudo, podem apresentar volatilidade maior em comparação a fundos de renda fixa de menor risco, como os de títulos atrelados ao CDI. "É um fundo suscetível a variações das taxas de juros no mercado", afirma Sandra, da Órama.

Ela lembra que, assim como observado em outros ativos no mercado, a volatilidade desses portfólios também subiu nos meses de maio e julho com a greve dos caminhoneiros e o agravamento da crise na Turquia. "Contudo, mesmo perdendo na parte prefixada [com a alta das taxas], o investidor é protegido pelo ganho com a variação da inflação, que subiu em junho. Ele não vai perder dinheiro", lembra.

Para se proteger dessa volatilidade, a gestora Brasil Plural Asset Management faz hedge para a parte prefixada de juros. "Pelo fato de o nosso fundo ter ′hedge′ ele sofreu menos com a alta recente das taxas prefixadas de juros", diz o sócio e gestor de crédito privado do Brasil Plural, Rafael Zlot. No ano até julho, o fundo da gestora acumulava um ganho de 6,10%. O gestor pondera que esse é um investimento com horizonte de médio e longo prazo.

Outra vantagem do fundo é que ele também conta com a isenção fiscal oferecida para quem faz a aplicação direta no papel. Mas para ter o benefício esses fundos precisam alcançar o percentual mínimo de 85% do patrimônio aplicado em debêntures de infraestrutura no prazo de até dois anos do lançamento.

Fonte: Valor - Finanças, por Silvia Rosa, 24/08/2018