A avaliação do governo é de que ele, finalmente, começou a entregar os créditos prometidos no início da pandemia, para sustentar milhões de micro e pequenas empresas durante a crise da covid-19. E isso se deve, sobretudo, ao efetivo início do Pronampe (Programa Nacional de Apoio as Microempresas e as Empresas de Pequeno Porte), linha de financiamento equivalente a 30% do faturamento da empresa no ano passado, para capital de giro, ao custo de Selic mais 1,25% ao ano. O universo é o de empresas com faturamento de até R$, 4,8 milhões por ano.

Na verdade, porém, apenas a Caixa já está operando com essa linha de crédito. “O Banco do Brasil é mais lento e o Itaú, Bradesco e Santander estão em fase final de arrumação para operacionalizar os procedimentos com esse público que não é o deles”, segundo disse um assessor do Ministério da Economia que está acompanhando o dia a dia dessas operações para se certificar de que o crédito está chegando ao tomador final.

“Nas nossas previsões, até o dia 15 de julho estarão todos os interessados operando com o Pronampe”, acredita essa mesma fonte, que monitora com lupa a atuação principalmente dos cinco maiores bancos do país.

Há, de fato, uma fase de adaptação até à elaboração dos novos modelos de contratos onde as garantias deixam de ser dadas pelo cliente e passam a ser assumidas integralmente pelo Tesouro Nacional, mediante o FGO - o Fundo Garantidor das Operações.

O fundo foi capitalizado pela União nesta semana em cerca de R$ 15,9 bilhões. E a taxa de juros que passa a ser de cerca de 0,3% ao mês e deixa de ser os 2% a 3% ao mês das linhas próprias das instituições financeiras para as micro e pequenas companhias.

O Pronampe somado à linha de crédito para empresas “âncoras”, do BNDES, e ao Programa Emergencial de Acesso ao Crédito com garantia integral do FGI - Fundo Garantidor de crédito de Investimentos, também do BNDES, devem representar quase R$ 300 bilhões em oferta de crédito para as micro, pequenas e médias empresas.

Foi exatamente esse universo das micro e pequenas empresas que a Caixa havia definido como estratégico para suas operações desde o ano passado e, em poucos dias, conseguiu “botar no ar” a linha de crédito do Pronampe.

Segundo o vice presidente de Negócios de Varejo da Caixa, Celso Leonardo Barbosa, do dia 17 até ontem, a instituição havia fechado 6.500 contratos no valor de R$ 308 milhões que já foram depositados nas contas das empresas. Além disso, tem 5.700 contratos no valor de R$ 310 milhões, em fase final de negociação sejam os empreendedores clientes da Caixa ou não. A previsão inicial da Caixa é de atender a demanda de até R$ 3 bilhões mas, se for necessário, ela aportará mais recursos para esse fim.

Criado pela lei 13.999 de 19 de maio, o Pronampe já nasceu com a necessidade de adiar por mais 90 dias o prazo de contratação que se encerraria no fim de julho. Portanto, a linha de crédito estará em vigor até outubro.

O quadro atual de interesses do sistema financeiro em contratar crédito com as micro e pequenas empresas, até quarta feira, era o seguinte: 21 instituições manifestaram intenção de aderir ao programa. Dessas, no entanto, apenas oito iniciaram o pedido de adesão, três instituições concluíram testes para operacionalização (Caixa, Itaú e Bancoob) e 2 formalizaram adesão ao programa (Caixa e Itaú). Até ontem porém, só a Caixa havia contratado operações com garantia do FGO.

Esse é um mundo novo para os bancos tradicionais que gostam mesmo é de ter na sua clientela grandes empresas que podem despejar garantias em eventuais contratos de financiamentos. Para colocar o Pronampe em pé, o governo teve que capitalizar os fundos garantidores (FGO e FGI) e dar um jeito de assumir integralmente o risco de crédito para micro, pequenas e médias empresas.

Feito isso, o sistema financeiro está tendo que reavaliar suas premissas de análise de risco e ampliar as hipóteses de tamanho das empresas em seus portfólios. E não é raro um ou outro banco pedir ajuda da Caixa para lidar com essa nova clientela.

Isso leva o mais liberal dos liberais a defender a existência de um banco estatal com funções sociais para os momentos de crise aguda.

E reforça, ao mesmo tempo, a postura do ministro da Economia, Paulo Guedes, que na famosa reunião ministerial do dia 22 de abril, entre uns e outros desatinos cometidos pelos participantes, defendeu a privatização do Banco do Brasil que, afinal, é um bicho híbrido e, como tal, não justifica sua porção estatal.

Quando o Comitê Gestor do Simples Nacional prorrogou o prazo para o pagamento dos impostos federais, o fez por até 180 dias. Os Estados e municípios, no entanto, prorrogaram por somente 90 dias o pagamento do ICMS e do ISS, de forma que dia 20 de julho serão cobradas as parcelas relativas à abril.

O assessor especial do Ministério da Fazenda, Guilherme Afif Domingos, telefonou para o secretário de Fazenda do Estado de São Paulo, Henrique Meirelles, que é o porta voz dos governos estaduais nessa questão, para saber porque eles não pensam em ampliar a prorrogação dos impostos por mais 90 dias, Meirelles tergiversou, dizendo que essa não era a proposta dos demais governadores etc. e tal.

Afif interpretou tal posicionamento como uma maneira de os Estados da federação tentarem obter mais alguma vantagem da União em troca de uma nova prorrogação.

“Eles pararam a atividade econômica nos seu Estados e agora querem cobrar impostos dos microempresários! Querem o quê? Incentivar a inadimplência?”, indagou Afif, que pautou sua vida pública em defesa dos micro, pequenos e médios empresários.

“Isso aí é moeda de chantagem. Eles querem usar os microempresários para ver se tiram uma vantagem a mais da União”, disse ele.

Claudia Safatle é diretora adjunta de Redação e escreve às sextas-feiras
E-mail: claudia.safatle@valor.com.br


Fonte: Valor Econômico - Brasil, 26/06/2020