O fim do repasse de recursos do FAT ao BNDES, previsto no substitutivo do relator da reforma da Previdência Social, deputado Samuel Moreira (PSDB-SP), é neutro para o resultado fiscal primário do governo central (Tesouro, Previdência e BC), mas a mudança poderá favorecer a dinâmica da dívida pública bruta, explicaram especialistas consultados pelo Valor.

O impacto favorável pode ocorrer porque, atualmente, os recursos do FAT recebidos pelo BNDES sensibilizam a liquidez do mercado, o que força o Banco Central a fazer operações compromissadas com títulos públicos para enxugar o excesso de dinheiro na economia, com o objetivo de manter a taxa básica de juros (a Selic) no nível desejado. Com o fim do repasse, o BC não será mais obrigado a fazer essas operações.

No substitutivo, Moreira propõe que a arrecadação do PIS e do Pasep, que hoje alimenta o FAT, passará a financiar o programa do seguro-desemprego, o abono salarial e ações da Previdência Social. O substitutivo define que pelo menos 28% dos recursos arrecadados com os dois tributos serão destinados ao Regime Geral de Previdência Social (RGPS), mais conhecido como INSS.

Pela Constituição, 40% dos recursos arrecadados com o PIS/Pasep têm de financiar programas de desenvolvimento econômico através do BNDES. Como a União desvincula 30% da receita do PIS/Pasep, o BNDES termina recebendo 28% dos recursos dos dois tributos. No substitutivo, a destinação de recursos para financiar programas de desenvolvimento desaparece e o BNDES, que é o atual executor do programa, deixaria de receber dinheiro do FAT.

Os técnicos observam, no entanto, que destinar 28% dos recursos do PIS/Pasep ao RGPS não reduz o déficit desse regime. Isso porque o Tesouro já utiliza o total da receita dos dois tributos para calcular o resultado primário do governo central. Assim, os 28% destinados ao RGPS pelo relator não seriam receita nova.

Especialistas consultados pelo Valor disseram que, caso a mudança sugerida por Moreira seja aprovada pelo Congresso, haverá, na prática, apenas uma troca de fonte orçamentária. Os recursos do PIS/Pasep seriam nova fonte para cobrir despesas previdenciárias, que permaneceriam do mesmo tamanho. Os gastos do RGPS são dados pelas atuais regras previdenciárias em vigor.

O receio dos especialistas é que a mudança proposta dê margem a que o governo repita a mesma contabilidade criativa adotada pela equipe da ex-presidente Dilma Rousseff, quando foi feita a desoneração da folha de pagamentos de uma série de setores. Naquela época, ficou estabelecido que o Tesouro iria ressarcir a Previdência pela perda de receita causada pela desoneração. Com isso, parte da arrecadação do Tesouro era transferida e contabilizada como receita da Previdência. Estabeleceu-se dupla contagem da receita, prática adotada até hoje.

Os recursos arrecadados com o PIS/Pasep ingressam na conta única do Tesouro, na subconta do FAT. Com base nesses recursos, o FAT paga os gastos do seguro-desemprego, do abono salarial e dos demais programas de apoio ao trabalhador, que são despesas primárias.

O FAT faz também empréstimos, via BNDES, para programas de desenvolvimento econômico. Os fluxos entre FAT e BNDES são financeiros. A mudança proposta por Moreira põe fim à possibilidade de o banco receber mais recurso do FAT para programas de desenvolvimento.

A proposta não especifica o que será feito no futuro com o estoque de recursos do FAT, que era de R$ 306 bilhões no fim de abril, segundo o BC. A mudança que consta do substitutivo afetará apenas novos fluxos.


Fonte: Valor - Brasil, por Ribamar Oliveira - de Brasília, 26/06/2019