O Banco Central fez ontem a maior venda de dólares em mais de um ano - US$ 1,866 bilhão -, e o Tesouro Nacional voltou a dar saída a investidores por meio da compra de títulos públicos. Mas as atuações fracassaram na tentativa de amenizar a pressão tanto no mercado de câmbio quanto no de renda fixa. Para alguns analistas, a dinâmica dos preços já leva a crer que o Brasil poderá não escapar da necessidade de subir os juros, a exemplo de outros emergentes recentemente no centro da volatilidade global - Argentina e Turquia.

A despeito da pressão sobre o câmbio, o BC decidiu manter para esta quarta-feira o padrão recente dos leilões de swap cambial. A autoridade monetária manterá a oferta líquida de 15 mil contratos de swap cambial (US$ 750 milhões). E também fará leilão de rolagem, que continua hoje em 8.800 papéis (US$ 440 milhões). Ontem, a moeda americana fechou com valorização de 1,77%, a R$ 3,8097. É o maior patamar para um encerramento desde 2 de março de 2016 (R$ 3,8886).

"Achei ruim o fato de o BC não ter colocado todo o swap [oferecido ontem] e não ter aumentado a oferta [para hoje]", afirma o estrategista de um banco em Nova York, para quem, sem um alento do exterior, o dólar voltará a subir nesta sessão.

O pregão ontem já dava sinais de que seria de pressão sobre o real, uma vez que pares da moeda brasileira exibiam perdas relevantes lá fora. Mas no fim da manhã o dólar intensificou os ganhos de forma repentina, rompendo a barreira dos R$ 3,80. Com isso, o BC anunciou, pela primeira vez em quase 13 meses, atuações discricionárias via contratos de swap.

Além da operação já prevista para antes das 10h (na qual colocou US$ 750 milhões), o BC fez leilão de até US$ 1,5 bilhão em novos contratos de swap cambial, dos quais vendeu US$ 811 milhões. Logo em seguida, anunciou uma segunda operação extraordinária, ofertando os US$ 690 milhões não vendidos na primeira operação. No segundo leilão, colocou US$ 306 milhões.

No total, o BC injetou, apenas ontem, US$ 1,866 bilhão no sistema. É a maior venda líquida de dólares em apenas um pregão desde 23 de maio do ano passado, quando o BC colocou US$ 2 bilhões. Na ocasião, o mercado se ajustava aos efeitos das delações de executivos da JBS, que afetaram o governo de Michel Temer e fizeram o dólar disparar quase 10% em apenas um pregão.

Porém, as atuações do BC despertaram críticas de parte dos agentes, o que ajuda a explicar a retomada da alta do dólar até o fim do pregão. Analistas classificou o "modus operandi" do BC como "equivocado". O argumento principal é que a autoridade monetária decidiu gastar mais munição com o câmbio num momento em que o dólar subia em todo o mundo, tendência contra a qual o BC não deveria brigar.

"Entendo que o papel da autoridade monetária seja de suavizar os movimentos no câmbio... Contudo, acredito que, neste caso, a atuação do BC possa estar equivocada", diz o gestor de um fundo multimercado. Segundo ele, a antecipação de uma postura mais "agressiva" da parte do BC pode, até mesmo acelerar o movimento de depreciação do real. "Naturalmente, a próxima etapa seria [ou está sendo] o mercado começar a questionar os próximos passos de política monetária, começando a acreditar em uma potencial alta de juros para conter o movimento do dólar."

"Até pelo forte movimento dos DIs mais curtos, o BC será forçado a elevar os juros ainda neste ano, contendo esse movimento de piora", diz Luis Laudisio, operador da Renascença. Ele lembra que o próprio BC tem dito em comunicações oficiais que o juro atual está abaixo do patamar tido como estrutural. "Estamos longe da eleição, e o real parece sofrer um ataque especulativo, como foi o caso de Turquia e Argentina, guardando as devidas proporções. Pode ser mesmo que o BC seja forçado a dar uma calibrada no juro", acrescenta o operador.

Para se ter ideia do grau de ajuste pelo qual o mercado de juros e as precificações para a Selic têm passado, apenas ontem o CDI médio embutido nos contratos de DI para o primeiro trimestre de 2019 saltou 109 pontos-base, saindo de 7,24% ao ano na segunda-feira para 8,34% na terça. Em  outras palavras, os contratos de juros da B3 indicam alta de quase 200 pontos-base da Selic de hoje até o primeiro trimestre do ano que vem. O juro básico está atualmente em 6,50% ao ano.

Mas, para uma ala do mercado, o movimento de piora dos ativos já parece excessivo. Essa visão é compartilhada pelo sócio da Mauá Capital e ex-diretor de política monetária do BC, Luiz Fernando Figueiredo. "O mercado estava muito mal posicionado e a decisão do BC de interromper o ciclo de corte de juros deu uma chacoalhada", explica. Para ele, o dólar a R$ 3,80 "já precifica que o pior [na eleição] já aconteceu, mas é cedo demais para isso".

O ex-diretor acredita que a atuação do BC e do Tesouro estão corretas, mas admite que a intervenção do Tesouro pode ser considerada muito "paulatina" e isso ajuda a explicar a demora no alívio das taxas longas. Mas, no caso do BC, que reforçou a quantidade de oferta de swaps cambiais ontem, Figueiredo acredita que o mercado está "subestimando" a quantidade já ofertada. "Uma hora essa dinâmica será quebrada, cedo ou tarde. Mas não parece que esteja longe disso acontecer." (Colaborou Lucinda Pinto)

Fonte: Valor - Finanças, por José de Castro e Lucas Hirata , 06/06/2018