Um corte adicional de 0,25 ponto percentual (p.p.) da taxa básica de juros não daria um impulso significativo para uma retomada econômica que insiste em não engrenar. Mas, de acordo com alguns economistas, a manutenção inesperada da Selic em 6,5%, decidida pelo Banco Central (BC) na quarta-feira, adiciona ainda mais incerteza em um momento de dúvidas nos cenários interno e externo.

"A questão não é 0,25 ponto percentual de corte ou não. É pelo momento que o BC resolveu alterar seu plano de voo, um momento de muita volatilidade, inflação baixa, atividade baixa, com o hiato do produto fechando muito lentamente", afirma Zeina Latif, economista-chefe da XP Investimentos. Para ela, o Comitê de Política Monetária (Copom) havia dito antes da reunião de quarta-feira "com muito mais contundência" do que em ocasiões anteriores que iria cortar a taxa básica de juros.

De acordo com a economista, não é possível dizer o quanto o câmbio está sendo influenciado de maneira estrutural pelas mudanças do cenário externo. Zeina cita turbulências externas em diversas frentes - China, Coreia do Sul, Estados Unidos, Irã - para afirmar que faltou "serenidade" ao BC. "O comércio deu uma fraquejada na Europa e no Japão, por exemplo, mas está cedo para dizer que essa é uma nova tendência", diz. "Não é o momento de tirar grandes conclusões."

Justamente por essa dose adicional de incerteza, acredita ela, o "mercado reagiu mal" à decisão do BC. Ontem, o dólar fechou acima de R$ 3,70, máxima em 26 meses. "Essas puxadas de câmbio deixam o mercado sem referência, ninguém sabe se fecha contrato, não fecha contrato", diz. "Pelo menos por ora, o mercado está assustado. É um ruído a mais, via expectativas."

Em relatório, a equipe econômica do Banco Safra também afirma que a reação do mercado "é preocupante", por ter causado uma "substancial" alta dos juros futuros e pouco impacto sobre o câmbio.

"Isso sugere potencialmente o risco de um aperto das condições financeiras, o que pode levar a uma recuperação mais lenta adiante", diz o texto. Para o banco, esse cenário abre a possibilidade de ser necessária uma nova queda dos juros no futuro, afim de minimizar quaisquer impactos negativos sobre a atividade e "garantir a continuidade da, por enquanto, morna recuperação econômica".

Os economistas dizem ainda temer que os movimentos dos juros e de câmbio possam se retroalimentar, baseados em episódios anteriores no Brasil em que os mercados vão numa única direção. Nesse caso, uma intervenção adicional do BC no câmbio pode ser necessária no curto prazo.

Desde março, a mediana das estimativas do Boletim Focus para a Selic em 2018 está em 6,25%, mostrando que o mercado esperava, de maneira geral, um novo corte dos juros. Pesquisa pré-Copom realizada pelo Valor entre os dias 8 e 11 deste mês apontava também que de 42 instituições financeiras e consultorias, 37 esperavam um corte de 0,25 (p.p.) e apenas 5 calculavam que a Selic permaneceria em 6,5%.

Para André Gamerman, economista da ARX Investimentos, a manutenção da Selic pegou o mercado de surpresa, mas deve ter pouco impacto, seja ele negativo ou positivo, sobre a atividade econômica. O cenário externo turbulento e as dificuldades internas devem minimizar os efeitos da decisão do Copom sobre a retomada e o câmbio. Gamerman afirma que a decisão do BC foi acertada, "embora a comunicação não tenha sido perfeita".

Independentemente dos juros, a ARX já havia revisado para baixo a sua projeção para o crescimento do Produto Interno Bruto (PIB) deste ano, de 2,4% para 2,1%. Mas até essa nova projeção tem viés de baixa. Para o resultado do primeiro trimestre, que sai no próximo dia 30, a estimativa é de alta de 0,4% a 0,5%.

Um economista que preferiu não se identificar também afirma que o BC tomou a decisão acertada. De acordo com ele, a autoridade monetária também havia deixado claro em seus comunicados que não faria um novo corte caso não houvesse risco de a inflação ficar abaixo do piso da banda de tolerância, de 3%. "Com a desvalorização do câmbio, esse risco acabou", afirma. "O problema foram entrevistas no meio dos comunicados que adicionaram ruídos."

De acordo com esse economista, fatores como a eleição presidencial e o cenário externo colocam muito mais incerteza sobre a retomada da economia do que a decisão do Copom ou a maneira como ela foi tomada. Para ele, o câmbio deve continuar se desvalorizando, funcionando mais como um termômetro dessas dificuldades enfrentadas pelo Brasil do que como uma algo a ser perseguido pelo BC.

"No meio desse cenário externo e das eleições que estão por vir, há pouquíssima coisa que o BC pode fazer. Não adianta colocar nas costas dele algo que ele não foi criado para fazer", diz.

Fonte: Valor - Macroeconomia, por Estevão Taiar, 18/05/2018