Auditores do Tribunal de Contas da União (TCU) querem fazer uma diligência no Ministério da Economia para averiguar possíveis erros e omissões nas estimativas de despesas obrigatórias constantes no Orçamento de 2021. A fiscalização também pretende identificar inobservâncias de normas constitucionais na peça que está no centro de uma disputa entre o governo e o Congresso.

No dia 29, um grupo de parlamentares pediu ao TCU que se posicionasse oficialmente sobre o texto do Orçamento, chamado de “peça de ficção”. Um relatório preliminar da Secretaria de Macroavaliação Governamental, responsável pela análise, foi concluído anteontem e foi encaminhado ao ministro Bruno Dantas.

De acordo com os técnicos, somente uma diligência no ministério poderá reunir as informações necessárias para o parecer solicitado pelos congressistas. Há, no entanto, alguns alertas. O documento, ao qual o Valor teve acesso, menciona que um possível cancelamento de despesas com previdência, abono salarial ou seguro-desemprego, por exemplo, poderia sujeitar o Orçamento a algum controle de constitucionalidade.

“Nesse sentido, o cancelamento de despesas obrigatórias, especialmente as da seguridade social, pode não guardar afinidade lógica (relação de pertinência) com a proposição original”, o que, no caso de se confirmar, poderia sujeitar a matéria ao controle de constitucionalidade pelos Poderes competentes”, explica o documento.

Os técnicos alegam, todavia, não ser possível dizer - com as informações disponíveis no atual estágio em que as peças se encontram nos autos - se houve ou não alguma inobservância de norma ou diretriz constitucional.

A sugestão é de que o Ministério da Economia explique, por exemplo, o tamanho das dotações primárias consignadas no Orçamento para benefícios previdenciários, abono salarial, seguro-desemprego e compensações à Previdência pelas desonerações da folha.

Outro questionamento do relatório se refere ao montante das despesas primárias que excedam o teto de gastos públicos, “adotando-se como premissa a necessidade de se consignar dotações em montante suficiente para a cobertura de todas as despesas obrigatórias referentes ao ano de 2021”.

O TCU também quer que a equipe de Paulo Guedes detalhe quais medidas foram adotadas para assegurar “a plena compatibilidade da programação orçamentária com as regras fiscais, a meta de resultado primário, a ‘Regra de Ouro’ e o ‘Teto de Gastos’ considerando, para tanto, as estimativas mais atualizadas acerca da arrecadação de receitas primárias no exercício de 2021”.

A lista de questionamentos a serem encaminhados soma oito itens. Antes da diligência, no entanto, a presidente do TCU, Ana Arraes, terá que definir com quem ficará a relatoria do processo. A área técnica do tribunal apontou um suposto conflito de competências entre os ministros Bruno Dantas e Aroldo Cedraz, este último relator das contas presidenciais de 2021.

Ontem, o presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), elevou o tom e afirmou que aguarda uma posição do governo federal para que o impasse em relação ao Orçamento seja superado ainda hoje. A cobrança foi feita depois que Palácio do Planalto sinalizou que será difícil escapar do veto pelo menos parcial da peça. Segundo o Valor apurou, Lira também alertou o ministro da Casa Civil, Luiz Eduardo Ramos, que um eventual veto integral do Executivo às emendas parlamentares de responsabilidade do relator da proposta, senador Márcio Bittar (MDB-AC), pode impor dificuldades para a aprovação de medidas prioritárias no Congresso.

Lira prefere a sanção sem vetos, para posterior adequação. No entanto, a intenção de auxiliares do presidente Jair Bolsonaro é protegê-lo de problemas com eventuais interpretações de que a sanção poderia implicar no cometimento de irregularidades fiscais, ensejando riscos de processos como impeachment ou reprovação de contas, com risco de inelegibilidade.

O Ministério da Economia tem defendido que se vete o Orçamento alegando esses riscos, além das pressões da área técnica que não quer sofrer processos na execução de uma peça que está com valores subestimados para as despesas obrigatórias e que exigirá um corte gigantesco de gastos, que poderia travar a máquina pública.


Fonte: Valor Econômico - Brasil, por Murillo Camarotto, Fabio Graner, Marcelo Ribeiro e Renan Truffi — De Brasília, 08/04/2021