Aprovado ontem pelo Senado, o novo presidente do Banco Central, Roberto Campos Neto, deu diversas indicações de que pretende dar continuidade à linha de atuação de Ilan Goldfajn. Ao discorrer sobre política monetária, o economista defendeu postura de "cautela, serenidade e perseverança", ecoando exatamente as mesmas palavras usadas pelo Comitê de Política Monetária (Copom) em suas últimas duas reuniões para justificar a manutenção da taxa básica de juros no patamar atual de 6,5% ao ano.

Para Campos, o trabalho realizado pela atual diretoria da autarquia foi "excelente" e permitiu reduzir a inflação e balizar as expectativas. "Esse trabalho só foi possível, a meu ver, com o reforço da credibilidade institucional, que se encontrava abalada pelos resultados negativos colhidos em 2015 e em parte de 2016. Esse reforço se baseou na transparência, na cautela, na serenidade e na perseverança da condução da política monetária, valores que devem ser preservados e aprimorados no que for possível", discursou o economista.

Com a aprovação de seu nome, a previsão é que a posse aconteça ainda nesta semana em cerimônia no Palácio do Planalto. As nomeações de Bruno Fernandes e João Manoel de Mello para as diretorias de Política Monetária e Organização do Sistema Financeira, e da advogada Flávia Perlingeiro para a direção da CVM também receberam aval do Senado.

Na Comissão de Assuntos Econômicos (CAE), onde os quatro foram sabatinados pela manhã, os nomes foram aprovados por unanimidade, com 26 votos a zero, em uma sinalização importante de apoio político às indicações do governo, pelo menos na economia.

Durante a sabatina na CAE, que durou mais de quatro horas, o agora presidente do BC não só respaldou a mensagem de política monetária da equipe de Ilan, mas se comprometeu com outros pontos considerados relevantes pela gestão que está perto do final.

Ele defendeu, por exemplo, a chamada agenda BC+ da autarquia, destacando que pretende manter - e aprofundar - iniciativas voltadas à redução do spread, ao aumento da competição e à modernização do sistema financeiro. Nesse contexto, Campos reforçou especificamente sua experiência e interesse nas novas tecnologias financeiras. Destacou ainda que quer dar atenção especial a temas como "fintechs", desenvolvimento do pagamento instantâneo e o chamado "open banking", que abre espaço para o cliente autorizar o compartilhamento de seus dados com outras instituições.

No tema dos spreads bancários elevados, alvo de diversas perguntas de senadores, Campos se apegou ao argumento do BC de que o fenômeno decorre de uma série de fatores estruturais, dos quais o lucro dos bancos é o que tem peso menor. Também relativizou a concentração bancária, desconsiderando-a como fator a tornar os juros do crédito tão altos no Brasil.

Segundo o novo presidente do BC, a concentração no país é semelhante à verificada na Alemanha, Inglaterra e Itália, e há competição entre as instituições, o que seria o mais importante. Na visão dele, a inadimplência, o custo financeiro e os impostos têm importância maior na composição dos spreads.

Campos diz que, para lidar com essas questões, o BC já tem iniciativas como o cadastro positivo e medidas voltadas a melhorar as garantias, como a duplicata eletrônica. O economista destacou ainda a importância do fomento ao mercado de capitais, principalmente para garantir o acesso de pequenas e médias empresas a fontes alternativas de financiamento.

Na sabatina, o novo chefe da autoridade defendeu o projeto de autonomia do Banco Central, em tramitação no Congresso. Fez uma defesa da reforma da previdência, destacando que esse e outros ajustes fiscais são importantes para a trajetória sustentável do setor público, outro discurso frequente de Ilan. "A estabilidade fiscal é fundamental para a redução das incertezas, o aumento da confiança e do investimento, e o consequente crescimento da economia no longo prazo. Estou certo de que avançaremos nessa direção", afirmou.

Durante a sabatina, Mello, que em sua diretoria lidará com a agenda regulatória, fez ampla defesa da concorrência financeira como instrumento para baixar o custo dos empréstimos, mostrando-se um pouco mais incisivo na intenção de acentuar a concorrência no sistema. Segundo ele, é preciso fomentar a competição com medidas legislativas e "vigilância constante" na análise de atos de concentração. Já Fernandes afirmou que a reversão das medidas expansionistas por parte das economias avançadas e o enfraquecimento dos principais parceiros comerciais do Brasil constituem riscos para o país.

O presidente do Bradesco, Octavio de Lazari Jr., afirmou esperar que a nova gestão do BC seja de avanços em temas como eficiência e modernização do sistema financeiro. Segundo ele, a autonomia do BC e a estruturação de bases sustentáveis para o crescimento do crédito são "pilares fundamentais" para isso, disse por meio de uma nota.

Candido Bracher, presidente do Itaú Unibanco, elogiou a intenção de Campos de dar continuidade "ao bom trabalho realizado pela gestão anterior" na condução da política monetária e no controle da inflação. (Colaboraram Vandson Lima e Talita Moreira)


Fonte: Valor, por Fabio Graner - de Brasília, 27/02/2019