O novo governo de Jair Bolsonaro avalia a cobrança de valores bilionários de outorga em parte dos futuros leilões de estradas federais como forma de obter receitas para a criação de um fundo rodoviário nacional. A ideia é alocar os recursos arrecadados diretamente no caixa do Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes (Dnit), que sofreu corte drástico em seus últimos orçamentos anuais e tem dificuldades para conservar a malha sob sua responsabilidade.

O plano, ainda embrionário, contempla a cobrança de outorga nas relicitações das rodovias que foram privatizadas nos anos 1990. Estão chegando ao fim os contratos da Nova Dutra (Rio-São Paulo), da Concer (Rio-Juiz de Fora) e da CRT (Rio-Teresópolis). Todos expiram em 2021 e o ex-presidente Michel Temer preferiu não renová-los - a decisão deve ser mantida por Bolsonaro.

Há obras relevantes ainda por fazer nos novos contratos dessas concessões, como uma nova pista na Serra das Araras (Dutra) e a nova subida da Serra de Petrópolis (BR-040), mas são investimentos menos grandiosos do que duplicações inteiras ou intervenções programadas em rodovias privatizadas pela primeira vez.

Com isso, os estudos em elaboração devem indicar uma tarifa de pedágio mais baixa do que na maioria das concessões para tornar os projetos viáveis. Esses estudos, que estão sendo feitos pela Empresa de Planejamento e Logística (EPL) em parceria com o IFC (braço do Banco Mundial), devem ficar prontos entre o fim de 2019 e o início de 2020. As relicitações ocorreriam, portanto, só em meados do ano que vem.

Ainda não há estimativas de valores, mas uma autoridade na área de infraestrutura acredita que seria plenamente factível cobrar pelo menos R$ 1 bilhão ou R$ 2 bilhões como outorga em cada um dos contratos e sem encarecer demais as tarifas de pedágio. As cifras são, por enquanto, meras especulações. Só evidenciam a possibilidade de o fundo rodoviário ser capitalizado e render ao Dnit um orçamento valioso para a manutenção da malha federal que não tem viabilidade de concessão à iniciativa privada.

A autarquia, que já teve mais de R$ 14 bilhões para investimentos nos tempos áureos do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC), viu o orçamento minguar para R$ 8,3 bilhões no ano passado e deve ter ainda menos dinheiro em 2019. Todo o Ministério da Infraestrutura - pasta à qual o Dnit está subordinado - ficará com apenas R$ 8,9 bilhões.

O governo federal sempre optou por fazer leilões de rodovias tendo a menor tarifa de pedágio como referência. Fixa-se um valor máximo e ganha a concorrência quem oferecer o maior deságio. A cobrança de outorga tem sido uma característica das estradas concedidas no Estado de São Paulo pelas administrações tucanas. Mesmo assim, não há precedente para relicitações de rodovias com contratos encerrados.

A ideia do fundo rodoviário nacional tem como base um conjunto de recomendações formuladas pelo Programa de Parcerias de Investimentos (PPI), no fim do ano passado, à equipe de transição. Curiosamente, um dos autores das sugestões foi o então secretário de coordenação de projetos do PPI, Tarcísio Gomes de Freitas. Durante os trabalhos no Centro Cultural Banco do Brasil (CCBB), sede da transição em Brasília, ele foi convidado para ser ministro da Infraestrutura.

Para o advogado Maurício Portugal Ribeiro, especialista em estruturação e regulação de projetos de infraestrutura, será preciso encaminhar alguma alternativa contra a paralisia de investimentos do Dnit e a deterioração da malha federal que não foi privatizada. "Acho que faz todo sentido. Esse fundo poderia custear não só obras públicas, mas também contrapartidas da União em concessões patrocinadas ou administrativas", afirma Portugal.

Levantamento do próprio Dnit aponta que 59% das rodovias administradas pela autarquia estavam em bom estado de conservação no ano passado e 13% eram consideradas péssimas. Em 2017, a proporção de estradas boas alcançava 67,5% e as péssimas eram 13%. A piora dos indicadores é atribuída à crise orçamentária.


Fonte: Valor, por Daniel Rittner - de Brasília, 09/01/2019